sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

FACA COQUEIRO

Foto J C Paixão Côrtes

Faca famosa de outrora


Dentre elas destacamos uma, integrada até mesmo hoje, no folclore gauchesco: "a coqueiro". Não era fabricada na cidade de Pelotas, como muitos pensam, mais sim importada pela firma Scholberg, cuja sede comercial estava em Liége, Bélgica. A referida firma, com filiais em Montevidéu, sob o nome de Broqua & Scholberg e na cidade de Rosário na Argentina, estabeleceu em Pelotas, no ano de 1850, uma outra filial, sob a razão comercial Joucia, Scholberg & Silva. Como sócios faziam parte, além de pelotenses, o francês Leopoldo Joucia, vice-cônsul da França (ou pessoa representativa daquele governo) e que também estava ligado ao comércio de famosos vinhos franceses. Mais tarde outro gaulês incorporou-se à firma: Armand Gadet.


Mas a firma Scholberg pelotense era especializada na importação de armas, metais finos, talheres, cutelaria fina, ferragens, apetrechos de caça, munições, artigos de cristofel, quinquilharias afora peças que no decorrer de seu desenvolvimento comercial foram importantes fornecedores e das quais realizamos precioso levantamento, inclusive fotográfico com slides e cujos estudos daremos divulgação oportunamente.


Esta firma, na grande parte de seus artigos especialmente os de "metal branco garantido", traziam gravados além desses dizeres, a insígnia de um pé de coqueiro ou uma estrela de cinco pontas.


As facas vinham da Bélgica quase prontas recebendo aqui a postura do cabo e bainha. Dentro de vários tipos dos catálogos que Jouela, Scholberg & Silva possuíam, o gaúcho dava preferência à marca do "coqueiro" e desta a "coqueiro deitado", pois era um "ferro branco para qualquer lida"...


Esta marca aparecia junto ao cabo, colocada ao longo da lâmina (no comprimento) paralelo ao gume. Existia também o "coqueiro em pé", em que o mesmo ficava com a base virada para o fio, ou melhor, na largura da lâmina. O curioso é que em frente da própria firma — Andrades Neves, 651 em Pelotas, existia um pé de coqueiro, além de ver-se a título de propaganda, presa a distância da parede da referida casa, uma enorme faca colocada paralelamente a uma não menor espingarda de caça.


Não sei se o coqueiro ali visto já existia na via pública ou foi plantado posteriarmente pelos fundadores da firma. Teria o mesmo motivado o nome da marca? Ou ainda servido de inspiração ou aproveitamento para que o nome do famoso aço "coqueiril", dos quais as facas serem confeccionadas, fosse auditivamente associada ao coqueiro, pelo nosso gaúcho do campo, para maiores efeitos comerciais e publicitários, perfeitamente compreensível na época.


Mas a verdade é que embora a firma tivesse cerrado suas portas em 1936, ainda hoje, na esquina de fronte, onde outrora se transferira — atualmente ocupada pela casa Alegre — encontra-se um pé de coqueiro que, ferindo o plano urbanistíco do centro da Princesa do Sul, ainda é conservado como tradição na cidade, juntamente com outro existente na frente do colégio Gonzaga.


Atualmente quem tem a felicidade de possuir uma faca "coqueiro" a guarda como verdadeira jóia gauchesca.
Talvez por isso o brilhante poeta chucro do pago Jaime Caetano Braum, dedicou-lhe este poema:


Faca coqueiro


Cabo de madeira branca
E a folha de palmo e meio,
Esta faca que palmeio
Sovando uma palha buena
Larga, assim como novena
Nas festanças do Divino
Foi presente do Galdino
Filho de Dona Pequena!


Na prancha meio azulada
Deste regalo campeiro
Está gravado um coqueiro
Assim como um distintivo
Que me faz lembrar, altivo,
O charrua melenudo.
Bombeando longe, sisudo,
O velho solo nativo!


É nesse ferro crioulo
Que o meu fôlego embacia,
A cancha reta bravia
Por onde o fumo se espalha,
Com ele eu ajeito a palha,
Longueio, e, aparo crina,
E a barba, pra ver a china
Quando não tenho navalha!


Quando corto meu churrasco
Deixo branqueando o espeto,
E se na encrenca dos meio
Não sobre garrafa inteiro
Pois este ferro campeiro
De ponta como de prancha
Tem mania de abrir cancha
No costilhar do parceiro!


Por isso é que ao te palmear,
Sovando a palha de milho
Eu sinto, ó rude utensílio
Que muito primeiro que eu
O guasca já te benzeu
Quando num berro de touro,
Junto ao "bendito"de couro
Nalgum rival te embebeu!


E ao te arrancar da bainha
De ponteira reforçada
Evoco a rudez passada,
De teu áspero trajeto
Quando o xiru analfabeto
Contigo de companheira
Nas andanças da fronteira
Lonqueava o nosso dialeto!


Traste mil vezes relíquia
Por ser presente de amigo:
Hei de levar-te comigo
Sempre ao alcance do braço
E acolherar no teu aço
O presente e o passado
Até que pranche enredado
Por algum "seio de laço"!


E fica certo, Galdino
Ao te agradecer de novo,
Que no singelo retovo
Do meu gauderiar sem norte
Esta faca enquanto corte,
Até os últimos momentos,
Há de estar lonqueando os tento
Da nossa amizade forte!



Fragmento do texto do livro "Gaúchos de Faca na Bota - Uma dança Alemã no Folclore Gaúchesco", publicado em 1966, com 48 pgs., com fotos preto e branco, no formato 17 x 23 cm, Vol. 25 Edição da Comissão Gaúcha de Folclore, Porto Alegre (RS). Publicado em 1966, 2ª Edição, com as mesmas características, na Coleção “Cadernos Verde do Folclore Gaúcho – Regionalismo e Tradição”, Edição Grafipel, Porto Alegre (RS).

Texto ampliado do "Gaúcho de Faca na Bota" pode ser encontrado no acesso abaixo


http://www.jangadabrasil.com.br/revista/setembro70/pa70009c.asp


Postado por Carlos Paixão Côrtes

Um comentário:

Anônimo disse...

Buenas!! o sobrenome é Joucia ou Jouca??