quarta-feira, 4 de junho de 2008

Diário Caminhos de Santiago - RS - Veja Mais Fotos no SITE


CAMINHOS DE SANTIAGO DAS MISSÕES


O COMEÇO


A intenção de se fazer esse caminho teve inicio no dia 13.11.07 através da reportagem no jornal Zero Hora. Um amigo de Zaida lhe informou sobre esta matéria e ela entusiasmada começou a estabelecer os contatos e buscar informações. Essa é uma dica para quem quer caminhar, ter informações sobre o caminho pois o caminhante passa a ter segurança e se organiza com a alimentação, pernoite, apoio, etc.
Após as informações com a Prefeitura Municipal de Santiago, através da Mônica, começamos a fazer contatos convidando outras mulheres e que terminamos com este grupo:Zaida,Anie,Renise,Cecília,Sayonara,Liege,Graça,Silvana,Marlene,Cleusa,Sandra.Realizamos duas reuniões para a organização desta caminhada e definimos horários de saída de Criciúma , materiais para primeiro socorros principalmente para as bolhas, pagamentos, o que levar dentro das mochilas. Aqui já é uma dificuldade pois não sabíamos com certeza a previsão do tempo e nos organizamos para o frio já que sabíamos que a região é mais fria que a nossa e que tem muita terra vermelha. A bagagem e o espírito deveria ser a de um peregrino e deveríamos aprender isso na prática.
Alguns objetos são muito importantes para incluir na bagagem, estes indispensáveis: protetor solar, luvas para proteger do sol, viseira, toalha fralda é leve e tem muitas utilidades, protetor labial, cajado facilita o andar, a mochila foi essencial pois alivia a dor nas costas, as botas foram mais confortáveis que o tênis, cantil térmico, máquina fotográfica,roupa confortável.
Aqui neste grupo a Cecília já tem a experiência de Santiago de Compostela e a Zaida, Anie e Renise já fizeram Madre Paulina e junto com a Graça a Beata Albertina.
Neste momento já havia expectativa, curiosidade e muita ansiedade pois este caminho é novo para todas. Não havia até este momento, o que cada uma estava buscando mas um questionamento começava a aparecer: o que leva as pessoas mobilizarem energia para caminhar, caminhar, caminhar quilômetros por dia numa atitude de silêncio, oração, contato com a natureza, muitas bolhas nos pés e fortes dores no corpo?
Essa resposta só se tem caminhando e vamos tentar descrever essa nossa experiência entre os dias 17 e 23 de maio de 2008.(Anie)



A VIAJEM



São 04:00 hs da manhã do dia 17 de maio, no Posto Dario, Av.Centenário, acomodamos nossas bagagens e nos dirigimos ao nossos lugares num ônibus Mineirinho. Foi neste momento que cada uma externou numa palavra o seu propósito nesta caminhada:justiça,agradecimento,fortalecimento,energia,luz,sabedoria,força,saúde e dedicadas a alguma pessoas. Fizemos uma oração e dormimos.
Mais tarde paramos para um café e almoçamos em Soledade num ótimo restaurante a beira da estrada. No cardápio sopa de capelete, saladas e bife na chapa. Neste local algumas encantaram-se com uma loja de pedras brasileiras e fizeram compras.
Seguimos para São Miguel das Missões, onde fomos recebidos por Mônica as 16:00 hs na Pousada das Missões
.Aqui nosso ônibus se deslocou até Santiago onde ficaram nos aguardando até o fim da caminhada e levando alguns de nossos pertences.(Renise)





SÃO MIGUEL DAS MISSÕES

Nos alojamos nos quartos e aqui ficamos sabendo que uma equipe da TVE de POA estaria nos acompanhando durante todo o caminho com o objetivo de fazer uma matéria sobre o mesmo, divulgando esta parte da história do RGS.
E já iniciamos com atraso o primeiro compromisso conduzido pela professora Lúcia: a visita as ruínas onde conhecemos parte da história dos índios Guaranis naquela região, a relação com Portugal e Espanha com os jesuítas.
O registro do massacre que ocorreu não teve como ser apagado, está ali, vivo em cada tijolo, na construção, no sino de quase uma tonelada que comunicava a distância dos perigos próximos, no índio Guarani que continua presente naquele lugar, trabalhando e mantendo viva sua cultura representada por suas produções em madeira, vestimenta a aparência física. Ter o contato com eles emociona pois parece que estamos muito distantes daquela realidade, daquelas crianças sujinhas, com pouca roupa. A vontade era de dar banho e protege-las do frio e da fome. Mas nem sabíamos se isso era real ou se faz parte da cultura deles. Aqui, algumas adquiriram peças artesanais em madeira como lembrança mas para ajudá-los também.
Saímos dali e fomos tomar uma café, fazia um friozinho, céu estrelado e nos organizarmos para o show de luzes e cores nas Ruínas que acontece a noite.É a história verbalizada por atores nacionais acompanhada do movimento das luzes.É muito interessante, pena que não memorizamos tudo que ali ouvimos, pois é de uma riqueza só.É parte da história do Rio Grande do Sul, marcada pela guerra que matou índios Guaranis e Jesuítas onde juntos viviam harmoniosamente, preservando a natureza e respeitando cada sua cultura.
Retornamos a pousada, Mônica nos repassou todas as informações e combinamos os horários, aqui é que conhecemos a equipe( Bete, Elias, JK,Leandro) da TVE. Posterior a esse encontro nos acomodamos em dois quartos e adormecemos ansiosas para acordar cedinho e iniciar o caminho com nosso próprios pés.(Anie)

SÃO MIGUEL-MATO GRANDE-SANTA BÁRBARA

São 05:00 da manhã, ninguém consegue ficar mais na cama, nos arrumamos, tomamos um bom café e nos preparamos para a saída.
Fininho, o motorista do Fiat, gentilmente já organizou as sacolas no carro, e apresentou os comes ( frutas, cereal) e bebes(água,sucos) a serem servidos durante o caminho. Completamos o cardápio com água de coco, gatorade e banana passa pois tínhamos trazido para consumo.
Em frente a pousada colocamos as mochilas, nos apresentamos a TVE, fizemos uma oração e saímos em direção a Santa Bárbara, são 07:00 hs, temos pela frente 22 km no total a ser caminhado neste dia e sendo tudo registrado com muitas fotos.
Neste primeiro contato com o caminho, todas seguem juntas, estamos conhecendo a estrada, atentas as coisas do ambiente e se adaptando as pedras, poeira, sol, cachorros, peso das mochilas, botas e ao ritmo individual. Fomos acompanhados pela TVE mas tivemos a equipe como integrante do grupo, não modificou nosso jeito de ser por estar sendo acompanhadas por uma TV.
Neste trecho apanhamos laranjas, havia muitas, ouvimos a barulheira dos piriquitos nos pés de eucaliptos e fomos recebidos pela comunidade de Mato Grande na escola com um risoto,chá,suco de frutas. Até aqui são 14 Km.
A escola tem 140 crianças do Ensino Fundamental e que vem de diversas localidades com transporte escolar, a diversão nos finais de semana é o campo de futebol e o salão paroquial onde a vizinhança se encontra.
Descansamos após o almoço, esperamos amenizar o sol e seguimos adiante enquanto que outras caminhantes ansiosas seguiam eufóricas mesmo no sol escaldante.
Entendemos que ao se fazer um caminho, precisamos seguir o próprio ritmo do corpo, que alguns cuidados são necessários, o tempo deve apenas ser vivido para separar o dia da noite, os passos são marcados individualmente e naturalmente vamos nos conhecendo como peregrinas. Essa é uma construção íntima, pessoal que o próprio caminho ensina.
Ás 15:00 hs o segundo grupo despediu-se do pessoal que nos acolheu e partimos em direção a Santa Bárbara com mais 8 km pela frente.
Chegamos cedo, em torno de 16 hs, que delícia de sucos naturais para amenizar o calor. Por ainda ser dia, aproveitamos muito. Ficamos numa fazenda onde há criação de ovelhas, de gado para corte e atividades agrícolas mantidos pela tradição familiar. Conhecemos a história da velhinha de branco que aparece no bosque próximo ao rio Santa Bárbara, onde suas águas cristalinas e profundas guardam segredos que ainda despertam curiosidades por chega até ali. Álias, fomos até lá de camionete, todas na carroceria, em clima de emoção, risos, calor e vento no rosto. Não havia boné que ficasse na cabeça.
Este local tem um significado importante quanto ao trabalho, organização e esforço físico desprendido pelos Guaranis. Foi daqui que as pedras foram retiradas para a construção das ruínas lá em São Miguel. Impossível imaginar como foram transportadas até lá.
O entendimento de tudo isso fica por conta de cada um, peregrinar é se permitir viver o que o outro vive, por isso é muito além do caminho.
Somente sendo peregrino para poder sentir.
Ao anoitecer registramos um maravilhoso pôr do sol no campo. As fotos são lindas e de provocar dúvida se é de verdade. E estranhamos, pois estava numa posição a leste, isso por conta da localização da rota das Missões, 485 km de POA em direção ao oeste. Jantamos um suculento carneiro, há muito desses bichinhos nos campos que margeiam o caminho, e com muita salada.
Fomos descansar, divididos em três ambientes, dois para as mulheres e um para os homens- Fininho, Elias, Leandro e JK.
Nosso grupo, Renise,Graça, Anie e Zaida , ficou na casa antiga da fazenda no meio do campo. Estranhamos um pouco pelo silêncio, latido dos cachorros, da perereca grudadinha na janela do banheiro, do cantar do galo muito antes do sol nascer. Tudo é diferente do nosso dia-a-dia mas isso faz parte da peregrinação. Entender as diferenças, conviver um pouquinho com o jeito do outro viver, novamente fez parte da reflexão nesta noite. Agradecimento por este dia através da oração não poderiam deixar de acontecer.
Levantamos às 05:00 hs, recolhemos tudo e fomos pelo campo, iluminadas pela lua ,até o local do café.
Obrigado a essa turma da comunidade de Santa Bárbara.(Anie)


SANTA BÁRBARA – PARQUE ESCOTEIRO GUARANI- BOSSOROCA

Ah, esse trecho não foi moleza. Foram 35 Km de sol escaldante, bolhas nos pés, sem sombra, muita poeira, o peso da mochila e com pouco lugar para sentar. É lógico que tinha o leito da estrada de terra vermelha. Parecia que não tinha mais fim......sobe, desce,sobe morro, desce morro. E a pergunta era: falta quanto Fininho?Ele só respondia está quase chegando. Estávamos para trás do grupo, engatadas numa segunda Anie, Graça e Zaida, uma dando força para outra, parecendo mulheres das Arábias. É só olhar as fotos.

Mas foi assim: estava previsto pernoitarmos em barracas do Exército no Parque Guarani, mas com a seca na região, não havia água suficiente naquele ambiente natural. Assim, almoçamos ali uma deliciosa refeição (feijão tropeiro, polenta,carne de panela,saladas e sobremesas típicas)preparada pela esposa de Raul
Este parque está localizado no meio de um campo, afastado da estrada geral e para se chegar até ele passamos por entre cavalos e gados, é de propriedade particular e vem sido utilizado pelo grupo escoteiros de Bossoroca. As instalações são suficientes para se passar o dia e não saberia dizer como teria sido se tivéssemos dormido neste local. Acho que foi uma decisão acertada passar só algumas horas e seguir adiante. Descansamos bastante, tiramos um cochilo acomodadas em colchonetes ao ar livre, massageamos os pés, por pelo menos duas horas aproveitamos para repor as energias. Era o primeiro sinal de cansaço físico visível. A Liege aqui não estava sentindo-se bem, enjoada e com calafrios. Repousou e teve força para continuar, suas pernas que tinham saído de Criciúma com muita fisioterapia,pareciam outras e comentamos “teu médico não vai acreditar que a dor não atrapalhou em nada”.
Aqui algumas do grupo já haviam partido pois queriam chegar cedo em Bossoroca. Nós sem pressa fomos tranqüilamente e entramos numa fazenda antiga onde ainda é preservado a senzala, móveis e uma santa esculpida em madeira Nossa Senhora da Conceição que segundo o proprietário da fazenda, ocorreu um incêndio e só esta imagem permaneceu intacta. Esse percurso era mais 1 Km de caminhada. Hoje tem sido motivo de pedidos de graças e adorada por quem visita a fazenda. Ou por aqueles que se dirigem exclusivamente para ter contato com N.Sra da Conceição
Raul nos acompanhou nesta visita, fizemos uma roda nos fundos do casarão e degustamos muitas laranjas cravas sem preocupação com o que tínhamos pela frente. Cada momento é único e deveríamos viver essa oportunidade.
Foi aqui que vimos uma cadela rodeada de filhotes mamando e refletimos na atenção materna , o aconchego e cuidado. Lembramos do mês de maio, das mães, de Maria. Nos despedimos e continuamos caminhando, rezando, cantando, gargalhando.
Caminhamos, caminhamos e anoiteceu quando ainda estávamos na estrada rumo a Bossoroca. Liege e Silvana já não agüentavam mais e já bem próximo da cidade precisaram do socorro de Fininho, indo de carro até a Pousada do Silêncio, foram 10 minutos de carero e uma hora caminhando. Aquela que fica pertinho da antena, foi o que Fininho nos disse e que era só procurar por ela que não iríamos nos perder.
Neste momento continuamos juntas Renise, Zaida, Anie e Graça muita cansadas e chegamos até lá na Pousada por volta das 19:00 hs aplaudidas por todas. Tomamos um rápido banho enquanto Sandra,Sayonara, Marlene,Cleusa e Cecília foram numa rádio local dar uma entrevista pois já haviam descansado e estavam prontas para o jantar.
Por volta das 20:30 hs seguimos a pé para o restaurante que fica na praça central de Bossoroca e fomos servidos por jantar caprichado.
A equipe da TVE continua conosco acompanhando, vivendo de uma outra maneira o caminho e sentíamos a vibração deles por nossa conquista, pareciam torcedores de time de futebol. Nem lembramos de perguntar quem é colorado ou gremistas,mas nós somos Criciúma, levamos até camisa para usar na caminhada. E dá-lhe Tigre!
Após o jantar, retornamos a pousada, demos um tratamento aos pés , fizemos nossa oração com quem estava em nosso quarto e dormimos programadas para acordar as 05:00 hs, tomarmos café e seguir em direção a fazenda Harmonia .Ah esses pés, será que as pessoas dão o devido valor para eles? Sustentam nosso corpo, nos levam por onde queremos ir, usamos muitas vezes calçados inadequados e só são lembrados quando há um desconforto com eles.(Anie)



BOSSOROCA – FAZENDA HARMONIA

Hoje foram 23 km, saímos por volta das 06:20 hs fizemos um trecho ainda na cidade,, de calçamento e o restante em estrada de chão. No entanto o sol deu o ar da graça nos acompanhando sem dó nem piedade. Tivemos pela frente muitas subidas, pouca sombra e muito calor. Conhecemos a história do cemitério dos Catitos entendida assim: era uma grande fazenda onde o senhor feudal vivia com sua família, num certo dia saiu para fora (foi viajar) ficando distante dali uns 3 meses. Seus serviçais entre eles 3 negros ficaram cuidando da casa e dos filhos, numa brincadeira entre o filho e os negros, o filho se machucou e acabou morrendo. A vizinhança revoltada matou os três e a cabeça de um deles foi pressa na portão de entrada da fazenda. O senhor feudal ao retornar se deparou com aquela imagem e não aceitou por parte da vizinhança tal atitude e para se resignar do ato cometido pediu que quando morresse fosse enterrado junto desses negros, vale lembrar que os negros não eram sepultados junto aos brancos. É há no cemitério dos Catitos apenas quatro sepulturas. Atravessando a estrada um pouco mais a frente está o cemitério dos homens brancos. Quantas histórias vividas há tanto tempo são mantidas ainda nos dias atuais pelos objetos, pelas narrativas contadas pelo povo.É só ter paciência e sensibilidade para ouvir.
Mais adiante, o grupo que ficou para trás, encontrou com a equipe da TVE e o Santo Fininho , próximo a uma única árvore, descansamos um pouco pois já havíamos caminhado quase cinco horas e tínhamos que chegar num eucalipal, onde seria a próxima parada de descanso. Parecia perto, logo ali e de novo sobe, desce, sobe, desce morro. A Renise e a Liege adiantaram um pouco mais a frente queriam ficar um pouco só.
É como caminhar num deserto e encontrar um oásis, nunca um eucalipal teve tanto valor, acolhia em seus galhos ninhos de piriquitos muito barulhentos e com sua sombra já bem pequena nos recebia esticadas no chão a beira da estrada. Quando no nosso dia-a-dia fazemos isso? Ficamos quase uma hora e não passou ninguém por aquela estrada. Fomos apenas observadas pelo gado. As demais já estavam longe de nós e algumas ligeirinhas já haviam chegado na fazenda antes do meio dia.
E não tínhamos saída, peregrino é assim reza, pensa nas pessoas doentes, na família, no trabalho, nos amigos, nos projetos, canta por que quem canta seus males espanta,observa a natureza,medita, descansa e caminha.
Caminha até chegar na Fazenda Harmonia, às 15:00 horas, faltando só nós, fomos recebidas pelo proprietário, o bonitão segundo a Zaida, mas é o Marco um dos herdeiros daquela beleza de lugar. A casa tem mais de 100 anos, passou de geração a geração, continua com alguma coisas originais e outras adaptadas. Atualmente tem produção leiteira, de ovelhas, de gado. Tomamos uma sopa que costuma ser preparada aos peões trabalhadores, de tanto ingrediente com que é feita. Tem até salsicha e charque, levanta qualquer um.
Marco durante a tarde nos disse que ao final da tarde, antes de escurecer, gostaria de nos levar um lugar que seria surpresa. Ficamos curiosas e fomos um pouco na carroceria da camionete, a equipe da TVE, Mônica e Fininho e um trecho a pé pelo atravessando o pasto. Era campo a dentro, no meio do gado, um capão onde ali antigamente o gado era escondido para não ser roubado.É um lugar afastado da casa, da estrada e não daria para ver que ali dentro poderia abrigar o gado. Permaneciam muitos dias até existir segurança novamente para retornar ao pasto. Há um rio escondido na mata, mas estava seco e no meio do capão uma clareira.
Sentíamos o quanto aquele espaço tinha valor histórico, beleza, proteção a natureza, de variedade na vegetação exalando um suave perfume. Retornamos em seguida pois já estava ficando muito escuro, aguardamos o jantar preparado por D. Bete e no cardápio feijão, carreteiro, saladas e abóbora caramelada preparada pela Cecília, e tudo no fogão a lenha. Jantamos sob o olhar da lua e protegidos por uma parreira de maracujá.
Depois de muita prosa lá na rua entre algumas peregrinas, os peões, Marco e amigos da TVE, ajudamos na limpeza e nos recolhemos, agrupadas entre quartos para as mulheres, sala para os homens que ficaram na conversa até tarde e o dono da casa junto aos peões, lá no galpão.
E no dia seguinte, ainda escuro e após o café com leite fresquinho, fomos em direção a Carovi onde almoçamos. Se chega até lá após 15 km.



FAZENDA HARMONIA- CAROVI


Saímos ainda era noite, até lembramos de lanterna, é um trecho com pedras, a lua e estrelas estiveram junto a nós um bom pedaço. Esperamos pela Zaida e Liege, outras seguiam adiante, em seguida o motorista de um ônibus parou e admirado perguntou quem éramos. A resposta imediata foi: de Criciúma – Sul de Santa Catarina distante daqui quase 800 km.
-E o que vocês fazem por aqui?
-Somos peregrinas, estamos indo em direção a Santiago.
-Mas é longe, falou ele
-É nós sabemos e só vamos chegar lá amanhã a noite.
Ele nem acreditou, desejou boa viajem e seguiu o seu caminho e nós o nosso.
fotografamos o nascer do sol que parecia estar a oeste, observávamos tudo, muitas orações de agradecimento por mais este dia aconteceram e continuamos.
Lá adiante, seu Cacildo também nos parou queria saber quem éramos e a cavalo nos seguiu lado a lado alguns quilômetros. Contava histórias da vida vivida no campo, disse que quando se vai a cidade se gasta muito, até para estacionar. Que ali anda a cavalo, vai aonde quer sem gastar nada.
É ele tem razão, somos envolvidos, seduzidos pelo capital e nem percebemos o quanto isso nos compromete nossa saúde mental.
E assim meditando com essas palavras simples chegamos em Carovi para almoçar uma macarronada caseira, saladas e suco de laranja, tudo preparado por três mulheres da comunidade exclusivamente para nós, obrigado garotas. Teve até sobremesa, humm que delícia, sagu de vinho. Obrigado “gurias”


Após o almoço, algumas seguiam em frente, Cecília saiu sózinha e outras permaneciam descansando, recuperando as forças. Temos mais 18 km pela frente.
Parar muito ao longo do caminho, é gostoso mas teve um problema: o sol e isso foi um fator significativo para nós. Parecia nos levar a exaustão e ser peregrino não se provoca dificuldades com a saúde física mas compreende-se e percebe-se melhor o próprio corpo.
E fomos em frente, passamos pelo local onde o general Gumercindo Saraiva foi baleado em 10/08/1894 por um espião que estava junto de sua comitiva, ele não sabia, e onde ele caiu do seu cavalo. Este trecho é um marco para a história do RGS e Uruguai, é o Capão da Batalha pertencente ao Capão do Cipó.
Esta parte do caminho foi muito puxada, paramos diversas vezes, dentre essas, uma na beira de rio, outra onde fomos recebidas pela D. Aida, seu Alfredo e Aionara, no portão da fazenda, com saboroso suco de laranja e um bolo campeiro. Obrigado pelo carinho pelas respostas as nossas indagações e curiosidades. E continuamos a caminhar protegidas por São Miguel, São Tiago e Maria.
Passamos por grandes fazendas onde a soja já havia sido colhida e a terra sendo preparada para nova safra, parecia um jardim exibindo com formosura suas flores lilás.É um nabinho que vai dar mais vida a terra.
Aqui o pôr do sol foi imponente e definido com cores fortes e vibrantes, escondia-se atrás do grande casarão e figueiras. Que lindo, é um quadro ao vivo que se modifica em segundos.
É o tempo que nem notamos passar em nosso dia-a-dia, quantos momentos semelhantes a esse não percebemos.
Os filhos nascem, crescem e quando nos damos conta deixamos de ter criança em casa e temos só adultos.
Já é noite, e nós ainda nem sabemos quanto falta para chegar na Esquina Palmeiro, mas Fininho diz está pertinho para nos dar força. Ele já deve estar cansado só de nos acompanhar, é uma atividade que requer paciência e colaboração e ele foi ótimo.
A Mônica já está onde vamos pernoitar, fica atenta a tudo para que dê tudo certo, o outro grupo chegou e ela acompanha nas acomodações. Se virou no trinta para coordenar tudo.
Obrigado a você e sua turma.
São 19:30 quando chegamos em Esquina Palmeiro, de um lado da estrada pertence a Capão do Cipó e do outro é Santiago. Novamente um suco artesanal de goiaba com laranja foi servido ainda embaixo das laranjeiras, onde sentamos para descansar um pouco e se organizar para o jantar e o pernoite.
As que chegaram antes ficaram na casa de D.Judite e as demais na casa em frente. A proprietária reside na cidade e por doença não consegue mais vir até está comunidade, e D. Judite por um forte vínculo afetivo cuida deste ambiente. Aqui a vizinhança ainda se conhece toda e para tudo se unem ajudando um ao outro. Diferente da cidade onde temos pouco contato com a vizinhança.
Após um descanso merecido, foi servido o jantar muito variado e farto, tendo sido preparado no fogão a lenha e em seguida nos recolhemos.
No dia seguinte as 05:00 hs levantamos, e as 06:15 fomos até a capela de São Judas Tadeu, onde fizemos a oração da manhã acolhidas por dona Judite e partimos.






ESQUINA PALMEIRO – CAPELA SÃO TIAGO


Até o local do almoço, na Estância São Lucas foram 17 Km, e no caminho grandes fazendas, gado, ovelhas. Até aqui a Sayonara nos acompanhou, e diminui o ritmo pois estava com fortes dores no tornozelo, não agüentou e pegou carona com Fininho. Para ela foi importante este momento, concluiu que em sua vida sempre faz tudo correndo mas que nem sempre concluiu como o programado. A caminhada nos proporciona um crescimento pessoal muito especial, é só se permitir. Ainda passamos por uma tropa com 245 cabeça de gado que estavam seguindo em direção contrária a nossa. Ë bonito de se ver.
E continuamos, encontramos mais adiante a equipe da TVE, haviam furado mais um pneu, o terceiro, estavam exaustos.
Nos mostraram uma entrada para um rio, onde fomos molhar os pés e descansar mais um pouco. Já era quase meio dia e a turma estava nos esperando por isso não dava para demorar.
Por volta das 13:00 chegamos na entrada da Capela São Tiago, cantamos e agradecemos muito, nosso esforço estava ali há alguns metros.
Ter um objetivo, ser persistente mesmo diante de todas as dificuldades vale a pena, e dá muita satisfação. A meta deve ser: nunca desista de seus sonhos.
Todos nos aguardavam, estavam ali a bastante tempo, mas fomos primeiro contemplar aquele que deu o nome a este caminho. A capela construída no alto, com vista para a cidade de Santigo, de pedra, entre o verde das pastagens e as exuberantes árvores acolhia em seu interior a imagem em madeira de São Tiago. E rezamos:

Apóstolo São Tiago

Tu fostes escolhido entre os primeiros.
Fostes a primeiro a beber
No cálice do Senhor...
És o grande protetor dos peregrinos.
Por isso, faz-nos fortes na fé e
Alegres na esperança,
Para que em nosso caminhar de peregrinos,
Nas andanças dessa vida,
Possamos sempre seguir o caminho de Cristo.
Alenta-nos hoje e sempre para
Alcançarmos a Glória de Deus Pai Todo Poderoso
Assim seja!


Saímos dali silenciosamente e fomos para o galpão da estância onde um churrasco, música gaúcha, o Secretário de Cultura, um historiador e o pessoal da casa nos recepcionavam entusiasmados.
Almoçamos e fomos ouvir a história daquele recanto gaúcho, emocionando quem relata e quem escuta. Parabéns povo gaúcho por tanta devoção a sua cultura, a sua terra e a sua gente.
Neste momento algumas peregrinas ficaram em dúvida de continuar, outras já não tinham mais condições físicas.
E nós, nos apressamos pois já era quase 15:00 hs e tínhamos mais 17 km de estrada de chão e parte de asfalto, que nos alertaram ser o pior trecho destes 147 previstos sem contar a entrada até o Parque Guarani e a fazenda onde conhecemos a senzala. Isso significa que foram mais alguns quilômetros além do previsto.




CAPELA SÃO TIAGO _ SANTIAGO




Voltamos até a Capela para nos despedir e agradecer por essa oportunidade e seguimos em frente observando as ovelhas se alimentando à sombra das árvores.
O sol não dava trégua, e não podíamos parar muito naquele trecho, pois havia uma acolhida e benção ,numa capela, especialmente a nós os peregrinos do Caminho de Santiago das Missões, o sétimo grupo.
Aqui as bolhas e a dor nos pés foram intensas, muita poeira, pedras, movimento intenso de caminhões e de carro de passeio, anoiteceu não enxergávamos direito e tínhamos que chegar.
Liege, Cecília e Renise pacientemente nos aguardavam num ponto de ônibus, e nós
Zaida,Graça e Anie nos juntamos a elas e rumamos a Capela São Judas Tadeu onde nos aguardavam, o pessoal da comunidade, nossas colegas peregrinas e a turma da Secretaria de Cultura e Turismo. Foi pura emoção, as lágrimas foram coletivas e a vibração por conseguirmos chegar não tem como descrever.
O padre, recentemente ordenado, nos recebeu entusiasmado e pausadamente associou as dificuldades da vida com as do caminho, a persistência e força de vontade de cada uma, e como mensagem final disse que sempre passamos por momentos difíceis mas somos capazes de superar se nos esforçarmos.
Esta canção exprime neste momento nossos sentimentos:

Ao Criador nós queremos louvar, por mil motivos temos à vida, que a mil motivos resume, por ela, nós agradecemos!
Obrigado, Senhor. Por tudo, obrigado, Senhor!
Animais, plantas, amigos, inimigos, inteligência; erros, futilidades, derrotas e o peso na nossa consciência.
Alegria, felicidade, sabedoria, fragilidade...aprender, da juventude até a velhice, a fraternidade.
Por tudo nós te agradecemos, momentos diversos da vida que temos...lembramos que És nosso Pai Criador e Te damos o nosso louvor.



E em seguida recebemos o certificado como tendo realizado este caminho, vale lembrar que em todas as paradas foi carimbado o passaporte de peregrino recebido por nós no primeiro dia.
E a noite fomos a um jantar italiano gostoso e caprichado, regado a muita música e dança com as crianças do projeto social Criança Feliz. Foi lindo. Valeu criançada e professores!
Parabéns a todos e muito obrigado.
E após, já por volta da meia noite, fomos dormir para cedo retornarmos a Cricúma.
São Tiago, Rogai nós!
São Mateus. Rogai por nós!


Anie Juçara Fabris Casagrande
Criciúma - Santa Catarina